A natureza é perfeita - Dia de Veterinária

Em 12/03/2010 09:22:00 AM
 
 

Enviado para você por sweetygirl através do Google Reader:

 
 

via = Tudo Gato = de Lauesg em 01/12/10


 Cruzou, e agora?

Falamos no artigo anterior sobre as vantagens e desvantagens da castração, mas ainda nos deparamos com uma grande maioria de gatas que saem de casa, namoram e presenteiam a família com uma gestação inesperada. Não vou justificar minha casuística de gatas gestantes por trabalhar com uma população carente do interior da Bahia, porque mesmo os nada carentes na minha região ainda não praticam a posse responsável com a castração.

Os proprietários de gatos que eu atendo se dividem em dois grupos: os informados e os desinformados. Os informados trazem os gatos para vacinação, castração, problemas de pele e afecções do gato idoso. Os desinformados de bom coração trazem o gato atropelado, envenenado ou em trabalho de parto. Os desinformados sem coração nem chegam na porta, vão no petshop, compram um anti-concepcional e aplicam na gata que acabou de cruzar.

Eu deveria ter castrado a minha gata... mas não castrei e ela cruzou.. e agora?

Em hipótese alguma você deve administrar o anti-concepcional depois que a gata já tiver cruzado. Essa prática não vai impedir que a gata gere os filhotes e aos 57-63 dias, quando ela deveria parir, os níveis de progesterona ainda estarão altos na corrente sanguínea e ela não entra em trabalho de parto. Os filhotes morrem porque a gata não entrou em trabalho de parto. A recomendação do veterinário será: (1) castrar até 7 dias depois que cruzou, lembrando de todos os riscos inerentes à cirurgia; (2) a administração de um medicamento que vai promover a reabsorção do embrião ou aborto do feto, a depender do estágio da gestação; (3) cuidar da gatinha até o parto, e depois se responsabilizar pela doação dos filhotes, com posterior castração da mãe.

Como ultrassonografista, as principais dúvidas dos proprietários são:

Quantos filhotes? Quanto tempo falta para o parto? Quando marcar uma cesárea?

A ultrassonografia é uma ferramenta de imagem que é capaz de diagnosticar a gravidez
positiva a partir de 20 dias de gestação. Na minha prática eu peço que venham sempre depois de 30 dias que estima-se que a gatinha tenha cruzado. Nesse momento são identificadas as vesículas uterinas, o início da forma embrionária e os batimentos cardíacos, sendo possível também contar com maior acurácia a quantidade de filhotes. Geralmente as gatinhas são trazidas para a ultrassonografia com mais de 45 dias e, devido ao tamanho e desenvolvimento dos fetos, a contagem pode ser superestimada.

A maioria de ultrassonografias que eu já realizei em gatas gestantes foi para verificar se havia algum problema pois elas já estavam em trabalho de parto há pelo menos 6 horas.
Quando uma gata está com dificuldades para parir chamamos de distocia, e a ultrassonografia vai servir apenas para verificar se há fetos vivos e, se houver, se estão em sofrimento. O sofrimento fetal é avaliado pela mobilidade dos fetos e pelo batimento cardíaco, que deve ser superior a 200 bpm. Para verificar posicionamento dos fetos no canal pélvico o exame de imagem ideal será o raio X.

Essa semana uma proprietária entrou em contato comigo com o seguinte histórico:

- Doutora, a minha gatinha cruzou há 15 dias. Gostaria de saber qual será o procedimento do parto, se eu posso interná-la com alguns dias de antecedência.

Minha resposta começou com:

- A natureza é perfeita... o parto na vida da gata gestante é um dos momentos mais especiais, e ela vai escolher o lugar onde quer parir. Geralmente ela escolhe sua gaveta de calcinhas, mas arrume um local aonde ela se sinta a vontade, sem ameaças e predadores (como outros gatos, cães e crianças), que seja limpo, forrado, e torça para ela querer parir ali. Levar a gatinha para parir em uma clínica veterinária será um martírio para ela. Imagine que usamos 3% do nosso cérebro em identificar cheiros, o gato usa cerca de 30%. Ao chegar na clínica, a gatinha vai saber exatamente quantos poodles, rottweilers, outros gatos, funcionários e até os estagiários que passaram por ali no último mês. Não, não vamos trazer a gatinha.

- Mas então, doutora, podemos marcar a cesárea e eu só a levo no dia?

- Bom, senhora, novamente eu falo que a natureza é perfeita e virtualmente todas as fêmeas são capazes de terem o parto normal. Imprevistos acontecem e a gente só deve intervir quando eles acontecem. Se realizarmos a cesárea 1 a 2 dias antes do dia do ideal, sem esperar a gatinha entrar em trabalho de parto, diminuímos muito as chances dos gatinhos sobreviverem e terem um desenvolvimento normal.

- Mas, doutora, eu não tenho estrutura para ver a minha gatinha parir, quero que ela tenha parto cesárea sim.

- Bom, eu sinto muito mas a senhora precisa se estruturar. Ou procurar alguém que o faça.
Pense que uma mulher que tem parto cesárea sofre alguns dias depois do parto, tendo que manusear o bebê e se cuidar, e na maioria das vezes ela tem ajuda. Agora imagine uma gata, sem ajuda, com cerca de cinco bebês que precisam ser limpos, aquecidos e alimentados, enquanto ela sente dor e o pior, a cicatriz da cesárea fica exatamente entre as mamas, o que não acontece com a mulher. Pense bem.

No final das contas eu consegui convencê-la a fazer o pré-natal da gatinha, esperar o dia do parto, dar-lhe a oportunidade de tentar parir sozinha e em paz, e somente intervir se houver necessidade.

Claro que eu sei que no dia desse parto o meu celular vai tocar a cada 5 minutos, mas eu prefiro ser a pessoa a não ter sossego do que traumatizar a gatinha por decisões precipitadas.

Por essas e outras muito se fala por aí, é melhor prevenir do que remediar. #ficadica

Alice Albuquerque
diarioveterinaria.blogspot.com
twitter @alicevet

 
 

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